O efeito da guerra
Meu querido menino adormecia calmamente em meus braços sujos de poeira e sangue. Tinha a respiração um tanto pesada, o ar por aqui estava... digamos, em péssimas condições. Enquanto que ele dormia calma e tranquilamente como se de fato nada disso estivesse acontecendo, eu estava alarmada, prestando atenção em cada sentido meu: olfato, visão, tato, audição e até mesmo o paladar; ah, claro, e no sexto sentido que todos deveriam passar a considerar mais importante: intuição. Em tempos caóticos como este, ela tornava-se nossa melhor amiga. Parte de minha misteriosa - porém eficaz - intuição dizia-me para ficar, a outra dizia que deveria sair. "Se ficar o bicho come, de correr o bicho pega". Fecho os olhos por um breve instante, tentando me acalmar. Como? Como achar tranquilidade no meio de uma guerra? Ela provavelmente estava soterrada junto de dezenas de centenas de inocentes. Dentre eles, meu marido. Abri os olhos e uma lágrimas escorreu por meu rosto sujo, deixando um fino rastro molhado e um tanto mais limpo que antes. Olhei para meu menino novamente. Seis anos de idade. Seis. Não vivera praticamente nada! E duvido que tampouco irá. Deveria ter ao menos um pouco de esperança, mas como ter esperança quando praticamente tudo que você amava perdeu-se em meio a pedaços de concreto? "Seu filho", uma voz sussurrava em minha mente toda vez que cogitava em desistir. Talvez a única coisa que ainda me deixava com vestígios de sanidade. Beijei os cabelos sujos de meu filho e apertei-o contra meu peito, abraçando-o.
- Quando tudo isso acabar, escaparemos da Síria. Prometo. - Sussurrei com a garganta seca, gastando o último lote que tinha de esperança nessa palavras cheias de incertezas.
Então aconteceu.
Repentinamente, tudo ficou em câmera lenta. Ouvi um enorme estrondo, meu filho acordou assustado. O prédio tremeu e grossos e enormes pedaços de concreto começaram a cair. "Fuja", pensei. Tarde demais, antes que sequer tivesse tempo de levantar. Olhei para cima e um enorme pedaço de concreto caia sobre mim e meu filho. Protegi-o com meu corpo, então senti algo pesado e sólido esmagando-me. Senti uma dor horrível, todos meus ossos estavam se quebrando. Logo, minha respiração cessou. Tudo ficou preto, a única coisa de que me lembro é de meu filho chorando e gritando, clamando por ajuda.
Imagens de minha curta vida foram passando pela minha mente como em um filme, porém no modo acelerado: eu criança aprendendo a andar de bicicleta, minha boneca favorita se quebrando, abraçando meus pais, primeiro beijo, minha formação, meu casamento, tendo meu doce e belo filho, abraçando os dois homens que mais amava em toda a minha vida, levando meu filho para o primeiro dia de aula dele, notícias da guerra, a tentativa falha de escapar, a notícia de que o corpo de meu marido não fora encontrado, minha última promessa, o teto desabando sobre mim e meu filho e seus gritos de socorro.
Então tudo escureceu.
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